Primeiro Capítulo – Livro Delito Latente

Capítulo 1 – Notícias Já

Rio de Janeiro, 1º de setembro de 2014.

Rubens Mello percorria apressadamente a estação de metrô da Carioca. Um homem alto, forte e negro correndo pelo centro da cidade chamava atenção das pessoas. Aos vinte e oito anos, já havia se acostumado a receber olhares que o condenavam pelo tom da sua pele. 

Nasceu em uma família de classe média. Sua mãe era professora de matemática em uma escola municipal, na Penha; seu pai era contador e prestava serviços a escritórios no centro da cidade. 

Rubens se formou em jornalismo pela Universidade Hélio Alonso, em Botafogo, e há três anos trabalha em uma emissora independente de notícias, que mantém um canal no Youtube, séries de Podcasts, além de serativa no Twitter. O escritório do “Notícias Já” ocupa uma sala de 150 metros quadrados em um prédio localizado em frente à Torre Almirante, construída no lugar do Edifício Andorinha, famoso na década de 1980 pelo grande incêndio iniciado por um curto-circuito em um dos andares. O acidente, ocorrido no dia 17 de fevereiro de 1986, matou 21 pessoas, feriu mais de 50 e foi capa dos jornais da época por vários dias seguidos. 

Quando o canal iniciou suas atividades, a equipe era composta por três jornalistas que se conheceram na faculdade. Alugaram um escritório pequeno no bairro de Bonsucesso, mas três anos mais tarde, com o sucesso que alcançaram, tiveram que contratar outros dois jornalistas e buscar um novo local para acomodar a nova estrutura. Isso foi há seis meses, logo após atingirem a marca de sete milhões de inscritos no Youtube

Rubens achava curioso o fato de terem conseguido um excelente escritório vizinho ao Edifício Andorinha, já que seu pai, na época do devastador incêndio, alugava uma pequena sala em um dos andares que foi completamente destruído. Por sorte, ele não se encontrava no escritório, pois acompanhava a esposa que dava à luz naquele mesmo dia. 

Depois de percorrer com pressa o trajeto entre o metrô e o trabalho, ele chegou à portaria do prédio. Estava atrasado para a reunião mais importante da equipe, na qual seria definida a pauta do mês. Cumprimentou o bem-humorado porteiro, funcionário do edifício há vinte anos, enquanto pressionava repetidamente o botão do elevador. Impaciente, olhou para o relógio. O movimento era grande àquela hora da manhã e, pouco a pouco, a fila aumentava atrás dele.

Para adiantar, abriu a pasta de couro marrom escuro pendurada na transversal do tórax e retirou o notebook. Dentro do apertado elevador, Rubens aproveitou para iniciar o computador e abrir os arquivos que havia preparado durante a madrugada. Ao chegar ao 11º andar, ele se despediu das poucas pessoas que seguiam ao piso superior, o último do prédio.

Com uma das mãos, abriu a porta do escritório, com a outra, equilibrou o computador e, com a boca, segurou uns papéis. “Já é hora de contratar uma secretária” ⏤ Pensou. 

Correu para a sala de reuniões, onde todos o aguardavam ao redor da mesa ovalada para dez pessoas. 

⏤ Chegou quem sempre falta! ⏤ Comentou Júlia, com sarcasmo.

⏤ Não enche o saco, Júlia! Trabalhei até de madrugada fechando os roteiros dos podcasts da semana. ⏤ Revirou os olhos, enquanto se sentava acomodando seus pertences à sua frente. 

⏤ Acabou a palhaçada dos dois? ⏤ Questionou Rodrigo, antes de continuar.

⏤ Como eu estava dizendo, já temos alguns assuntos fechados para o mês, mas quero sugerir que cada um traga outros tópicos que possam ser interessantes. 

Rubens pegou uns papéis, distribuiu entre os colegas e falou.

⏤ Ontem, enquanto fazia umas pesquisas, vi que no final desse mês completa um ano do sequestro daquela jornalista Betina Zetser, que ocorreu lá na Colômbia. Será que não seria interessante tentar uma entrevista com ela? Colocá-la ao vivo pra contar sua experiência e como está a sua vida depois do episódio? 

⏤ Parece que ela mora em Londres. Anda meio sumida da mídia, sua última entrevista foi em outubro do ano passado, não há mais nada na rede. Nenhum artigo assinado por ela. Nada! ⏤ Rodrigo completou, com os olhos voltados para a tela do computador, enquanto fazia uma rápida pesquisa sobre a repórter. 

Intrigados com o seu sumiço, eles concordaram que poderia ser uma boa história para explorar. Rubens se comprometeu a descobrir o paradeiro dela. Também se prontificou a entrar em contato com alguns parceiros colombianos, eles deviam ter material para trabalhar na reportagem de um ano do episódio. 

Ao final da reunião, Rubens entregou uns papéis para Júlia com rispidez, que era o roteiro do podcast em que havia trabalhado, e disse: 

⏤ Toma, “manézona”! Aqui o motivo do meu atraso, agora vai fazer o seu trabalho. ⏤ Depois, saiu rapidamente, sem dar chance para que ela retrucasse. 

⏤ Ei! Pega leve aí, Rubens! Eu tava só brincando. ⏤ Gritou, para que ele a escutasse.

Enquanto Rodrigo, Júlia e Anderson se preparavam para iniciar a gravação do podcast na ilha acústica localizada no centro do escritório, Rubens, em seu posto de trabalho, buscava informações do caso de Betina Zetser nos jornais da época. 

No final da tarde, ainda não havia conseguido nada novo. Tinha mandado um e-mail para ela. Nele, apresentava-se e a convidava a participar, ao vivo, do programa sobre seu sequestro, mas a mensagem retornou momentos depois de ser encaminhada, em três idiomas diferentes, e tinha os seguintes dizeres: 

“Prezados, 

Estarei em período de férias por tempo indeterminado. Para assuntos profissionais, por favor entrar em contato com o e-mail: contact@therealist.com

Atenciosamente,

Betina Zetser”

Sem desistir de encontrá-la, encaminhou uma mensagem para a redação do The Realist e esperava receber uma resposta o quanto antes. Enquanto isso, entrou em contato com seus parceiros colombianos, pedindo ajuda para conseguir fotografias da época, imagens que não tivessem sido utilizadas na ocasião. Queria publicar um material inédito. 

Algumas horas mais tarde, quando já estava em casa, recebeu a resposta da agência colombiana e conseguiu negociar a compra de três fotografias. A primeira era a imagem do médico colombiano que atendeu Betina no hospital, falando com a imprensa. A segunda, uma foto de Betina deixando o hospital, acompanhada do marido Bruno Jopson. E a terceira registrava Betina conversando com algumas pessoas na porta da igreja onde aconteceu a missa em memória de Mauricio Vargas, o informante da jornalista que a ajudava no caso que ela investigava e que fora assassinado. Rubens analisou as imagens e baixou-as em seu computador, indo dormir logo após terminar a sua segunda cerveja. 

No dia seguinte, no escritório, ele trabalhava na matéria sobre Betina. Redigia o texto no computador e mantinha sobre a mesa as três fotografias impressas que comprara. Rodrigo se aproximou. Precisava falar com Rubens sobre o seu comportamento com Júlia. Desde o mal-entendido na reunião do dia anterior, ele a tratava com impaciência e Rodrigo queria evitar o desgaste da relação entre os dois. 

Apoiado na mesa do colega, Rodrigo falou baixo. Não queria chamar a atenção dela, que trabalhava a poucos metros. Para disfarçar, pegou uma das fotografias, fingindo discutir algo sobre a imagem. Depois de expor as suas considerações, observou a foto com mais atenção e perguntou do que se tratava. Rubens explicou que havia conseguido o material através dos seus contatos colombianos e ele se interessou, tomando em suas mãos as outras duas fotografias. 

⏤ Essa mulher é bonita pra cacete, viu! ⏤ Rodrigo comentou, enquanto olhava as fotos em que Betina aparecia. Rubens riu e concordou.

Cismado, Rodrigo continuou olhando as duas imagens e exclamou.

⏤ E essa foto aqui!? Quem é o sujeito aqui no canto? Conheço ele de algum lugar!

 Antes que Rubens pudesse ver o que lhe chamava atenção, ele continuou. 

⏤ Peraí! Eu sei quem ele é! O que esse médico estava fazendo lá? ⏤ Apontava para Dr. João Alencar, capturado ao fundo enquanto saía do hospital, no momento em que o médico que cuidava de Betina falava com a imprensa.

E aí gostou do que leu? Quer continuar?

Lembrando que 25% dos royalties das vendas da versão kindle serão revertidos para a ONG Symap, em Paraisópolis/SP

2 respostas para “Primeiro Capítulo – Livro Delito Latente”.

  1. Avatar de Andréa Gnone de Oliveira
    Andréa Gnone de Oliveira

    Parabéns, Lulu! Dar vontade de ler até o final do livro.

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